167 As aparências enganam

 Leitura Bíblica 

“Quem crer em mim, como diz a Escritura, do seu interior fluirão rios de água viva”.” (João 7.38) 

Hoje a leitura me levou novamente ao evangelho de João. Novamente ao capítulo da Festa dos Tabernáculos. Lendo o capítulo uma coisa ficou martelando na minha cabeça: “repare quantos pré-conceitos, quantos pré-julgamentos”. 

De fato, o capítulo já se inicia com os irmãos de Jesus emitindo um julgamento: 

“Ninguém que deseja ser reconhecido publicamente age em segredo. Visto que você está fazendo estas coisas, mostre-se ao mundo”. Pois nem os seus irmãos criam nele.” (João 7.4-5) 

Veja, “dentro da sua casa” partiu o primeiro julgamento. Eles julgam: de que adianta fazer isso aqui? Se você quer fama, a festa é o lugar certo para obtê-la! Mas a resposta de Jesus é certeira: 

“Então Jesus lhes disse: “Para mim ainda não chegou o tempo certo; para vocês qualquer tempo é certo.” (João 7.6) 

Jesus complementa dizendo que ninguém deseja a morte deles, ao contrário do seu caso, que mostra o que querem esconder. Ou seja, seus irmãos não precisam se preocupar tanto, todo tempo é tempo, toda hora é hora, mas Jesus tem um propósito e para esse propósito existe um tempo correto. 

O texto continua: 

“Na festa os judeus o estavam esperando e perguntavam: “Onde está aquele homem?”” (João 7.11) 

“Entre a multidão havia muitos boatos a respeito dele. Alguns diziam: “É um bom homem”. Outros respondiam: “Não, ele está enganando o povo”.” (João 7.12) 

“Os judeus ficaram admirados e perguntaram: “Como foi que este homem adquiriu tanta instrução, sem ter estudado?”” (João 7.15) 

As pessoas não entendiam como alguém vindo da Galileia, pobre e sem estudo poderia saber tanto sobre a Lei e os Profetas. A religião naquele tempo havia se tornado um elemento de controle e dominação, com os saduceus e os fariseus definindo cada aspecto da religiosidade, que por sua vez governava o cotidiano da população. Uma pessoa sem o “treinamento” formal se apresentar com conhecimento das leis e das Escrituras era uma afronta ao sistema dominante e desafiava a lógica vigente. 

O povo acostumado a ver os sábios e os doutores da lei sempre bem vestidos e membros da elite da sociedade não conseguiam entender como Jesus poderia saber tanto assim. 

Mas Jesus mesmo lhes respondeu: “Não julguem apenas pela aparência, mas façam julgamentos justos”.” (João 7.24) 

O curioso é que tal preconceito e pré-julgamento não vinha apenas das camadas mais simples da população. Os próprios doutores da lei, que deveriam preservar e compreender sua aplicação, eram os primeiros e talvez os mais preconceituosos: 

““Será que vocês também foram enganados?”, perguntaram os fariseus. “Por acaso alguém das autoridades ou dos fariseus creu nele? Não! Mas essa ralé que nada entende da lei é maldita.” Nicodemos, um deles, que antes tinha procurado Jesus, perguntou-lhes: “A nossa lei condena alguém, sem primeiro ouvi-lo para saber o que ele está fazendo?” Eles responderam: “Você também é da Galileia? Verifique, e descobrirá que da Galileia não surge profeta”.” (João 7.47-52 

Ora! Veja se algo que presta sai da Galileia! Esses eram os doutores da lei, que sabiam todos os livros de cor e se orgulhavam disso. 

A mensagem do evangelho de João não é essa. João quer mostrar o Jesus que é o Verbo encarnado, o Deus que se fez homem e cumpriu as Escrituras, mas nessa passagem em particular junto com sua mensagem principal, João parece querer nos mostrar algo mais: que as aparências enganam e que, às vezes, mesmo todo o conhecimento do mundo pode nos levar a julgamentos precipitados. 

E então eu voltei ao versículo que me levou ao capítulo: 

“Quem crer em mim, como diz a Escritura, do seu interior fluirão rios de água viva”.” (João 7.38) 

Jesus está dizendo que ele é Deus, que se tornou homem, que se fez carne como homem, que fala com os homens, mas ele ‘é’. E aquele que nele crer com todo seu entendimento, de toda sua alma e com todas as suas forças, do seu interior correrão rios de água viva. Essa imagem me remeteu a uma passagem do Êxodo onde Deus fezuma pedra do deserto verter água: ““Pegue a vara, e com o seu irmão Arão reúna a comunidade e diante desta fale àquela rocha, e ela verterá água. Vocês tirarão água da rocha para a comunidade e os rebanhos beberem”.” (Números 20.8) 

Ora, Deus faz uma pedra verter água. Que dirá de nós? Nossa água viva ainda estava por vir naqueles dias, mas hoje é presente na vida de todo aquele que crê. O Espírito Santo de Deus está conosco como graça, dádiva gratuita de Deus. Ele jorra de quem nele crê e, por isso, o verdadeiro cristão não se contenta em contemplar o mundo ou se separar e aguardar a chegada do Salvador. Em vez disso, ele atua, impulsionado que é por esse rio que corre dentro de cada um e jorra dádivas e bem-aventuranças. 

A presença constante do Espírito de Deus na vida de um cristão talvez seja o maior sinal de sua conexão com o Pai, de sua fé e de seu sentimento. Suas ações e obras movidos por esse Espírito dão testemunho da graça de Deus na vida de cada um de nós. 

Depois de ler e pensar nisso tudo só me resta pedir ao meu Pai que eu seja menos afoito nos meus julgamentos, e que minha vida seja sempre um reflexo da presença do Espírito de Deus em mim. 

Em nome de Jesus. 

Amém. 

Autor: Shailon Ian